|
DESTAQUE 1
Código Da Vinci: a verdade e a mentira
Por Pe. Marcelo Barros (Monge beneditino, Brasil) e
Frei Gilvander Moreira (Padre Carmelita, Mestre em Exegese Bíblica, Brasil)
Nos dias em que as Igrejas cristãs de tradição antiga se preparavam para a festa litúrgica do Pentecostes, que celebra a vinda do Espírito de Deus para fecundar todas as culturas e tornar os discípulos e as discípulas de Jesus capazes de compreender os diferentes idiomas e linguagens da humanidade - a base da vocação para o diálogo com o diferente e a unidade - eis que apareceram, um pouco por todo o mundo, grupos de cristãos e pastores fazendo campanha contra o romance O Código da Vinci, do escritor Dan Brown e contra o filme dirigido por Ron Howard, inspirado no livro.
Estas campanhas contêm vários riscos e enganos. Podem até transformar-se em peça favorável à obra que querem atacar. Dizem que as informações do romance sobre o cristianismo e as origens da Igreja são todas mentirosas. No entanto, negam com tanta força as afirmações do livro que parecem aceitar a tese do autor de que se os tais segredos contidos no romance fossem descobertos, destruiriam a fé cristã.
Estas campanhas colocam-se, assim, no mesmo nível do escritor em seu fundamentalismo. A diferença é que Dan Brown propôs-se escrever um romance e não reconstituir a história. Os tais cristãos que pensam defender a fé atacando O Código da Vinci, além de fazerem propaganda da obra, ao reduzirem a fé a certas expressões históricas do dogma, testemunham uma fé fechada e rígida. Esta imagem negativa do cristianismo só os cristãos a podem dar.
Para quem não leu o livro e não viu o filme é difícil resumir a complexa trama do romance. Um director do Museu do Louvre é descoberto assassinado. Junto ao corpo, encontram-se estranhos códigos, escritos com o seu sangue. A polícia francesa pede a ajuda de Robert Langdon, norte-americano, professor de simbologia religiosa, que acaba por se tornar suspeito. Robert e Sophie, neta da vítima, saem como detectives, por vários países da Europa, atrás do segredo ali contido. Descobrem que o avô de Sophie era um dos líderes do Priorado de Sion, sociedade secreta que teria pertencido a Leonardo da Vinci e que tem como meta proteger um segredo milenar. Este crime, como outros, teria sido cometido pela Opus Dei, associação católica tradicionalista, que faz tudo para impedir que se descubra a verdade, há dois mil anos, ocultada pela Igreja: - Jesus Cristo foi casado com Maria Madalena. Era um simples homem que, no século IV, o Concílio de Niceia (ano 315 d.C.), sob pressão do imperador Constantino, teria divinizado. De facto, após a sua crucifixão, Maria Madalena, grávida de Jesus, teria emigrado para França e ali tem descendência, sendo que até hoje existe ali uma herdeira sua.
Actualmente, no mundo inteiro, comunidades cristãs da América Latina, África e outros continentes sentem necessidade de “des-ocidentalizar” o cristianismo, ou seja, que a fé cristã se expresse de um modo novo, mais apto a tocar no coração da humanidade pluralista de hoje.
Historiadores e teólogos sabem que foi sob pressão de imperadores e de conjunturas políticas pouco evangélicas que alguns dos Concílios antigos formularam importantes dogmas da fé cristã. É verdade que os imperadores antigos se utilizaram do cristianismo e que grande parte da hierarquia eclesiástica da época se deixou utilizar politicamente para conquistar o poder em nome de Deus. É verdade também que o imperador Constantino teve forte influência na afirmação dogmática do Concílio de Niceia (315) sobre a natureza divina de Jesus. Mas já não é verdade que ele tenha “inventado” a divindade de Jesus.
A fé de que, de alguma forma, Jesus é o Filho de Deus vem de tempos antigos. Apoia-se em afirmações dos Evangelhos que, embora tenham um significado mais simples, permitem esta interpretação. Hoje, várias correntes da Teologia estão aprofundando e propõem uma nova forma de compreender a pessoa de Jesus e sua unidade com Deus. Não há um dualismo entre natureza humana e divina. “Jesus foi tão humano, tão humano, que se tornou divino”, exclamou o papa João XXIII. Logo, Jesus tornou-se divino.
Conforme o que se percebe no romance, parece que uma possível relação amorosa entre Jesus e Maria Madalena seria a prova de que este é um simples homem e não Deus. Ora, desde os primeiros séculos, a maioria dos cristãos professa que se Jesus é divino, o é justamente por ser totalmente homem. A oposição entre ser divino ou humano não existe. Muitos dos que entram nesta polémica não percebem esta contradição. Ao negar que Jesus pudesse ter vivido uma relação matrimonial com Maria Madalena, pelo fato de ser Filho de Deus, reforçam uma visão sobre a divindade de Jesus que a Igreja cristã nunca aceitou. A questão se Jesus foi casado ou não com Maria Madalena pode ser discutida em termos históricos. Até hoje, não existe prova duma tal relação.
No ponto de vista histórico, as alusões a uma possível relação amorosa entre Jesus e Madalena baseiam-se em manuscritos descobertos em 1948 em Nag Hammadi (Egipto). São textos originários de seitas gnósticas (hoje diríamos esotéricas) dos séculos II e III. Entre eles, o chamado Evangelho de Filipe chama Maria Madalena de “a companheira do Senhor” e diz que Jesus a beijava na boca.
Nestes textos antigos, tais informações têm um sentido bem diferente da que ganham ao ser lidos hoje. Os gnósticos queriam superar os limites da corporalidade para serem mais espirituais. Para eles, a união entre o masculino e o feminino era vista como superação da divisão corpórea. Jesus e Madalena eram exemplos desta integração. O beijo na boca era como uma senha do grupo. Era sinal da comunicação da sabedoria interior. Dizer que Jesus beijava Madalena na boca era a forma de dizer que Jesus pertencia ao grupo deles e Maria Madalena era a depositária privilegiada da sabedoria comunicada por Jesus.
O livro aborda questões que a Igreja deve olhar com mais atenção, como a integração entre o masculino e o feminino e o consequente lugar da mulher na Igreja. Dan Brown recorda-nos que, nos primeiros tempos do cristianismo, algumas comunidades viviam isso de forma mais feliz. Maria Madalena era símbolo da comunidade cristã. Esta comunidade vive com Deus uma aliança de amor, simbolizada na relação entre o homem e a mulher. O próprio evangelho de João conta o encontro de Madalena com Jesus no jardim do sepulcro, na manhã do domingo, recorrendo a palavras do Cântico dos Cânticos, quando este narra a busca erótica da amada pelo amado (Ct 3).
A tradição ocidental confundiu a figura de Madalena com a da mulher adúltera e com a pecadora que unge com lágrimas os pés de Jesus em Betânia. Marcos e Lucas chegam a dizer que Jesus teria expulsado dela sete demónios (Mc 16,9 e Lc 8,2). Mas, nenhum evangelho ou texto antigo a chama de pecadora, prostituta.
Maria Madalena é citada nominalmente como discípula de Jesus (Lc 8,1-2) e como testemunha da sua ressurreição (Lc 24,1-10). Na história do cristianismo, muitos interpretaram mal a expressão: “Maria Madalena, da qual haviam saído sete demónios” (Lc 8,2). Essa expressão criou uma série de preconceitos contra Maria Madalena. O número sete, sempre simbólico, parece indicar a gravidade da situação. No encontro com Jesus, ela recupera a harmonia interior e entra num processo de crescimento e de amadurecimento pessoal, até atingir a plenitude do seu ser na experiência pascal.
No evangelho de Lucas (e nos outros evangelhos sinópticos) Maria Madalena é citada em primeiro lugar, indicando a sua liderança no grupo de discípulas de Jesus. Por isso, desde o começo da tradição apostólica, Maria Madalena recebeu o título de apóstola dos apóstolos, porque ela recebeu a principal ordenação, sem a qual nenhuma outra teria sentido: ela recebeu a ordem de lhes anunciar que Jesus estava vivo, ressuscitado.
O mais lamentável nesta história não é o que está atiçando a ira da maioria dos crentes. É que a fé cristã continue associada a nobres e a cavaleiros de guerra e não a pessoas consagradas à paz e a grupos empenhados em tornar este mundo melhor.
Entretanto, nisto, Dan Brown não inventou. Ainda temos no mundo um cristianismo ligado à cultura de guerras, conquistas e segredos de corte. Em tal atmosfera, fica fácil fazer romances de mistério. São muitos os que pululam por aí, sobre lendas do Santo Graal, Irmandade do Santo Sudário e outros.
Na realidade, o tal Priorado de Sion nada tem a ver com cavaleiros medievais. Foi criado em 1961, por Pierre Plantard, francês que, para conquistar credibilidade, inventou documentos que o ligariam à dinastia dos merovíngios e o Priorado de Sion a ordens medievais. A pesquisa histórica descobriu que os documentos eram falsos, mas a fantasia agradou a muita gente.
Quanto à Opus Dei, existe e é poderosa na Igreja e no mundo. Os crimes narrados no romance, atribuídos à Opus Dei são ficção. Entretanto, ao mostrar a relação entre fanatismo religioso e assassinato, o romance permite uma análise justa sobre fundamentalismos actuais, responsáveis por muitas das guerras que dilaceram o mundo.
O romance é comercial e o filme mais ainda. Entretanto, atraem multidões porque criam uma cumplicidade com as pessoas em procurar ver o humano masculino e feminino presente em Deus. O Código da Vinci faz com que muita gente, há tempos, desinteressada por qualquer assunto religioso, novamente aceite interrogar-se sobre a fé e a espiritualidade. Insistem em discutir os fundamentos do cristianismo, o que pode não ser fiel ao dogma, mas é saudável para a busca espiritual.
Mesmo se muitas das informações do romance não têm consistência histórica, somos sempre convidados/as a prosseguir a busca, como Maria Madalena, perguntando por Jesus no jardim da ressurreição ou como a amada do Cântico dos Cânticos que procura o amado na noite escura da vida. Certamente, Deus prefere ser procurado assim do que ser afirmado com a frieza do dogmatismo que não aceita discussões.
O mundo tem fome de Jesus e o que lhe dão?
In Diário Aberto www.padremariodemacieira.com.sapo.pt
O mundo tem fome de Jesus e o que lhe
dão? O Código Da Vinci. Primeiro em livro
depois em filme. E não é que as pessoas
lêem o romance concebido para dar uma
fortuna a ganhar ao seu autor e vêem o
filme como se um e outro fossem a verdade
sobre Jesus? Crime sem perdão é o que são!
Entre Jesus e o Dinheiro a incompatibilidade
é total. Desde que Jesus revelou que ninguém
pode servir a Deus e ao Dinheiro e que quem
serve o Dinheiro deixa de ser humano para se
converter em mentiroso e assassino nunca mais
os do Dinheiro lhe perdoaram. E tudo fazem
para o tirar do coração e da mente das pessoas.
A luta é duélica e manifestamente desigual. E
vai durar até ao fim dos tempos. As populações
têm de andar avisadas para se não deixarem
enganar. Pois neste duelo o Dinheiro conta com
meios cada vez mais sofisticados e eficazes. Ele
é a Besta que opera milagres e arrasta multidões
sem conta para os seus múltiplos locais de culto.
Jesus pelo contrário é como Deus. Limita-se
a bater à porta da nossa liberdade e aguarda
pela nossa resposta. Não opera milagres nem
prodígios. Não faz publicidade. Não tem media
ao seu serviço. E até as Igrejas que deveriam
ser uma só coisa com ele acabam quase sempre
aliadas ao Dinheiro contra ele e o seu Evangelho.
A via que Jesus propõe é a da porta estreita
que as multidões não estão dispostas a fazer
sua. Preferem o caminho largo que o Dinheiro
impõe. Dois caminhos antagónicos que muitos
tentam conciliar. E também muitas igrejas. Em
vão. Só a via Jesus é a Verdade que nos faz
livres. A via Dinheiro é a Mentira que nos mata.
É de Jesus que o mundo tem fome e as Igrejas
deveriam gastar-se dia e noite na missão de o
anunciar e à Boa Notícia de Deus que ele é. Em
vez disso gastam o melhor das suas energias em
estúpidos cultos sem cultura e sem profecia. Os
do Dinheiro aplaudem e até financiam. Enquanto
perseguem e matam quem o segue e anuncia.
Ide por todo o mundo anunciar a Boa Notícia
de Deus a toda a criatura. Esta ordem de Jesus
é dada a todas as discípulas e discípulos. Para
que de geração em geração o mundo creia e veja
despertar em si a mesma Fé de Jesus. E com
ela a salvação. Mas nós anunciamos o Dinheiro
e a sua Mentira. E só pode acontecer a Perdição!
Evangelizar os pobres é preciso. Dia e noite.
Contra o Império do Dinheiro e sua perversa
Publicidade que se faz passar por Evangelho
de Deus quando é a Mentira que mais oprime
e mata. Feliz de quem lhe resistir e se mantiver
fiel a Jesus e ao Evangelho de Deus que Jesus
é. Do seu Ser vive e respira o resto do mundo.
|
|
DESTAQUE 2
Carta Aberta ao novo Bispo de Leiria-Fátima
Vós tendes por pai a Mentira
Meu querido Amigo e Irmão
1. Como já lhe disse, por e-mail de 28 de Abril 2006, fiquei perplexo com a sua nomeação para Bispo de Leiria-Fátima. Escrevi então: “Ainda há tão pouco tempo em Viseu e já se vai embora? Parece que a Cúria Romana anda a brincar com as Igrejas locais. E as Igrejas locais, por sua vez, tudo suportam como se fossem cadáveres. Igrejas? Talvez, mas então nem frias nem quentes, como diz profeticamente o Apocalipse com que fecha/abre a Bíblia. Depois, Leiria-Fátima. Precisamente, a diocese que alberga a Mentira maior da Igreja em Portugal e que dá pelo nome de senhora de Fátima. Sabe tão bem como eu que aquilo é tudo Mentira. Arranjinho do clero católico. E que não tem nada a ver com Maria, a de Jesus. Muito menos com Deus, o de Jesus. Aliás, à luz da Teologia de Jesus, tudo aquilo é abominável. Tem o Medo por mãe e a Mentira por pai. Como tal, só pode ser fonte de idolatria e de ateísmo. Bispo de Leiria-Fátima? Só se for para desmascarar a Mentira e a Idolatria que Fátima é e promove. De contrário, será o passo mais desgraçado da sua vida. Bem sei que, se aceitar aquela Mentira e pactuar com ela, passará a andar nas bocas do mundo. E terá muitos devotos da senhora à sua volta. Mas não terá mais o Sopro de Jesus, esse mesmo que destruiu simbolicamente o templo de Jerusalém como o Perverso e como covil de ladrões”.
2. Porém, agora que acabei de ler o seu livro, de 70 páginas, Fátima e a Modernidade. Profecia e Escatologia (Edição Fundação Jornal da Beira), em que junta e divulga dois artigos escritos por si em diferentes circunstâncias, por sinal, ainda antes de ter sido nomeado Bispo de Leiria-Fátima, encontrei de imediato uma explicação para a sua nomeação. A Cúria Romana (não confundir com a Igreja una santa católica e apostólica) precisava a todo o custo de encontrar um Bispo na esteira do Bispo Serafim Ferreira e Silva, também meu Amigo e Irmão, que teve de resignar por limite de idade disposto a dar cobertura à Mentira da senhora de Fátima e à galinha de ovos de ouro em que ela, com o passar dos anos, se tornou para a nossa Igreja católica romana e para o nosso país turístico. Por sinal, encontrar um Bispo assim à medida da Mentira da senhora de Fátima não era tarefa fácil, sobretudo, depois do êxito editorial que continua a ser o meu livro Fátima nunca mais (Edição Campo das Letras, Porto), teologicamente irrefutável, e que já “obrigou” um papa, o fatimista compulsivo João Paulo II, a vir por mais duma vez ao santuário, numa desesperada tentativa de manter como verdade a Mentira que Fátima é. E não só. “Obrigou” também o mesmo Papa João Paulo II a nomear propositadamente um cardeal português para presidir à Congregação da causa dos santos, a fim de que esta fosse conivente com uma outra fraude não menor que a de Fátima (a Mentira institucional sempre foi e será muito fecunda e, por isso, gera mentiras e perversões em cadeia), a saber: a caricata beatificação das duas crianças irmãs, Jacinta e Francisco, sem dúvida, as vítimas maiores da senhora de Fátima. Terá bastado à Cúria Romana ler em diagonal os dois artigos que “fazem” o seu livro, para logo concluir que tinha encontrado o Bispo à medida que tanto procurava. Mas o Bispo acabado de encontrar por ela não tinha sido nomeado há muito pouco tempo para Viseu? E não estava a tentar levar por diante todo um interessante projecto pastoral naquela Igreja local? De nada quis saber a Cúria Romana. Um Bispo assim, tão crédulo na senhora de Fátima, e, para cúmulo, com um discurso mariológico aparentemente moderno, era o homem ideal para suceder ao Bispo Serafim Ferreira e Silva, oriundo da Igreja do Porto, que, com o passar dos anos, se veio a revelar no mais desvanecido sacerdote da deusa de Fátima, inteiramente disponível para todo o mal que ela e a sua Mentira quiseram fazer, e muito foi, como podem testemunhar todas as outras Igrejas cristãs do país e do mundo e a totalidade dos teólogos não fatimistas da nossa Igreja católica, assim como a cada vez mais alargada tribo dos ateus e agnósticos. E não é que o meu Amigo e Irmão Bispo António Marto não se fez rogado e disse logo sim à estratégia da Cúria Romana?
3. E agora que já tomou posse como Bispo da Diocese de Leiria-Fátima, tenho que lhe dizer, a si e a todos os eclesiásticos católicos com responsabilidade bispos residenciais e párocos que porventura também se revejam na teologia deísta e idolátrica com que teceu os dois textos do seu livro o que Jesus, o do Evangelho de São João, disse aos fariseus e demais chefes religiosos dos judeus seus contemporâneos que pontificavam no Templo de Jerusalém e se sentavam na cátedra de Moisés: “Vós tendes por pai a Mentira [= Diabo] e quereis realizar os desejos do vosso pai. Ele foi assassino desde o princípio e não esteve pela verdade, porque nele não há verdade. Quando fala mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso e pai de mentira.” (cf. todo o capítulo 8, mas em especial os versículos 42-59). E porquê?
4. Se o meu Amigo e Irmão Bispo António Marto já tivesse lido o meu livro Em Memória delas. Livro de Mulheres (Edição Campo das Letras), teria deparado lá com um texto teológico intitulado “O que nunca ninguém disse sobre Maria, mãe de Jesus”. E teria concluído que as coisas não são nada como os seus dois textos apresentam, quer sobre a senhora de Fátima (1.º texto), quer sobre Maria de Nazaré (2.º texto). A Teologia que os dois textos do seu livro veiculam é sem dúvida uma reflexão sobre Deus, mas um Deus-ídolo, como o de Fátima, que está nos antípodas de Deus Vivo que se nos revelou em definitivo na prática politicamente libertadora e integradora de Jesus e de Maria (exactamente por esta ordem, e não ao invés, de Maria e de Jesus). O Deus de Fátima, que subjaz a todo o seu livro, é um ídolo que devora as multidões que lhe apareçam pela frente, assim como todo o ouro que elas levem com elas: brincos, arrecadas, cordões, voltas, anéis; e dinheiro, muito dinheiro. Quando pede às multidões “oração e penitência”, está simplesmente a fazer um frete aos eclesiásticos católicos que, desde antes de 1917, estão por trás de toda aquela pueril e nefanda encenação. Na prática, o que esse Deus-ídolo pretende, com esse pedido de “oração e penitência”, é que as populações regressem em força às missas ao domingo, passem a frequentar de novo os templos, rezem terços em série todos os dias, obriguem os filhos e as filhas a inscrever-se como acólitos de missa, confessem os seus pecados aos pés dos senhores abades, usem medalhas e escapulários ao pescoço, zelem e enfeitem altares de imagens mortas de santas e de santos, ocupem-se com os nichos de imagens de deusas à beira das estradas, digam jaculatórias o dia todo, mandem rezar missas, muitas missas pelos mortos e as paguem ao preço tabelado pelas dioceses, continuem a submeter os filhos recém-nascidos ao rito do baptismo de água e paguem aos párocos para eles lho administrarem, observem o jejum e a abstinência nas semanas ditas da Quaresma, façam muitos sacrifícios “pela conversão dos pecadores” (entenda-se, todos os que já deixaram de frequentar o templo paroquial) e muitas outras coisas bobas do género. Na verdade, se as multidões cada vez mais deixarem de fazer estas coisas o que sucederá inevitavelmente quando elas forem adultas na Fé, pelo menos, como eu procuro ser e, sobretudo, quando também já tiverem passado da Fé em Jesus, para a Fé de Jesus com o que se ocuparão os párocos e os bispos residenciais, se todos eles, ou quase, nem consciência parecem ter de que a missão principal da Igreja é Evangelizar os pobres?
5. Em verdade, em verdade lhe digo e, na sua pessoa, digo a toda a Igreja que está em Portugal: A mensagem de Fátima, ao contrário do que todos os eclesiásticos fatimistas nos têm andado a impingir desde 1917 para cá, não é, não pode ser, a mesma coisa que a mensagem de Jesus e de Maria, sua discípula na ordem da Fé e da Graça, e sua mãe carnal, na ordem da natureza. A mensagem de Fátima digo-o aqui sem que a voz me trema é a reprodução a papel químico do obsceno Moralismo com que os Padres da Santa Missão e da Missão Abreviada, por aqueles sinistros anos do início do século XX, pervertiam e aterrorizavam as consciências das populações das aldeias do interior de Portugal. A apregoada “conversão” a que a mensagem de Fátima reiteradamente chama as populações é um regresso puro e simples àquele obsceno Moralismo. É, por isso, uma anti-conversão àquela que nos é proposta pelo Evangelho de Jesus. A “conversão” a que Jesus nos convida e que o próprio anuncia como Boa Notícia ou Evangelho de Deus, logo a abrir a sua missão de Enviado do Abba Pai/Mãe, consiste precisamente em trocar duma vez por todas todo esse obsceno Moralismo pela Boa Notícia de Deus que ele, o seu filho muito amado, trouxe/traz a todos os povos e a todas as nações, e que, lá onde for acolhida, deitará por terra todas as senhoras de Fátima e outras senhoras do género, mai-los seus cultos idolátricos que o Medo e a Mentira, desde os tempos mais primitivos, têm feito prosperar, como demónios, nomeadamente, entre as camadas mais atrasadas e mais iletradas das populações que habitam o planeta. Do que verdadeiramente se trata, meu Amigo e Irmão Bispo António Marto, na conversão anunciada por Jesus no seu Evangelho, é de mudar/trocar de Deus. Aquele “Convertei-vos”, na boca de Jesus, é o mesmo que: “Mudai/trocai de Deus”. Renunciai duma vez por todas ao Deus-ídolo cruel dos cultos do Paganismo, do Templo, dos sacerdotes e das Religiões e, sobretudo, ao Deus Dinheiro, o mais cruel de todos os deuses, e deixai-vos conscientemente acolher pelo Deus Abba Pai/Mãe que já vos habita desde o princípio e cujo Espírito ou Sopro está empenhado em fazer de todos vós, mulheres e homens, filhas suas, filhos seus bem adultos. Trata-se, na prática, meu Amigo e Irmão Bispo António Marto, de passarmos a viver todos os dias sob o impulso da Graça e da Verdade que nos fazem livres e responsáveis, em lugar de continuarmos a viver sob o impulso do Medo e da Mentira que nos mantêm oprimidos e em estado de menoridade a vida inteira e de geração em geração. E o meu Amigo e Irmão Bispo sabe tão bem como eu que quem não dá este passo para a Liberdade/Responsabilidade “nascer do Alto ou do Espírito, chama-lhe Jesus, o do Evangelho de São João 3 permanece no Pecado e a Verdade não mora na sua consciência. Tudo o que disser e fizer sai inquinado, não liberta nem cura, perverte e escraviza.
6. E que dizer da Mariologia presente no segundo texto do seu livro, por sinal, em tudo igual à que é hoje ensinada pela generalidade das Universidades católicas? Por mais que ela se apresente tecida de belas frases e de conceitos aparentemente ilustrados, tenho que lhe dizer que não me revejo nada nela. Permito-me lembrar-lhe a propósito o que é básico na Fé das Igrejas cristãs jesuânicas do princípio e que deverá ser normativo também para as Igrejas cristãs que hoje somos, no século XXI, em lugar de persistirmos em todas essas perversões que foram sucessivamente introduzidas na nossa Igreja católica por influência dos cultos das imagens das deusas do Paganismo, desde o tempo do imperador Constantino até ao Concílio Vaticano II, de feliz memória. Não! Não é por Maria que chegamos a Jesus, como se diz por aí e o seu livro parece reforçar. A verdade que nos faz livres e responsáveis é exactamente ao contrário. É por Jesus, o de Nazaré, Crucificado/Ressuscitado, que chegamos a Maria, sua discípula. Como é por Jesus que chegamos a Moisés e a Abraão, numa palavra, ao Antigo Testamento, simples "pedagogo", no lúcido dizer de S. Paulo (cf. Gálatas 3, 24-29). Não é pelo facto de Maria ser a mãe carnal de Jesus, que se tornou exemplo para nós, no plano da Fé e da Graça. Apenas por ter chegado a ser discípula do próprio filho, Jesus, o filho amado do Abba Pai/Mãe e, por ele, com ele e nele, ter-se finalmente aberto ao Deus dele. Aliás, são do próprio Jesus estas palavras: “Quem são minha mãe e meus irmãos?” E, depois de percorrer com o olhar os que estavam sentados à volta dele, disse: “Aí estão minha mãe e meus irmãos. Aquele que fizer a vontade de Deus, esse é que é meu irmão, minha irmã e minha mãe.” (cf. Marcos 3, 31-35). Sem o Sopro de Jesus ele é a definitiva Palavra de Deus feita ser humano entre nós e connosco ninguém, nem sequer Maria, sua mãe carnal, pode dizer Abba, Pai/Mãe (cf. Gálatas 4, 4-7; Romanos 8, 9-27). E no testemunhar do Evangelho de Marcos (ver, a propósito, o meu livro O outro Evangelho segundo Jesus Cristo), esta operação não foi nada fácil nem para ela, nem para os irmãos de Jesus. E só terá acontecido já depois da morte do próprio Jesus na cruz. Mas também não é fácil para todos e cada um dos seres humanos nascidos e criados dentro desta Ordem Económica e Política do Império e do Templo. A inércia é deixarmo-nos levar pelo Deus-ídolo que preside a esta Ordem Mundial e pelo seu perverso Moralismo. E, se for caso disso, nem sequer hesitamos em matar os profetas do Deus de Jesus. Tão pouco, hesitamos em matar, as vezes que forem necessárias, o seu Filho muito amado, Jesus, o de Nazaré. Mas é assim que mostramos à saciedade que continuamos a ter por pai a Mentira [= Diabo, Deus-ídolo] e que fazemos as obras do nosso pai, isto é, roubamos, matamos e destruímos (cf. João 10, 7-10). E tudo em nome do nosso Deus-ídolo!
7. Tenho de terminar. Muito mais poderia (deveria?) dizer sobre Fátima (as duas Fátimas, a de 1917 que culminou na desgraçada morte dos dois pequeninos “videntes” e no encarceramento de Lúcia no Asilo de Vilar, no Porto e, depois, o resto da sua vida, num convento de estrita clausura; e a Fátima das chamadas Memórias da Irmã Lúcia, aparecida só a partir de 1935, e praticamente a única que, para nossa vergonha, acabou por se impor); sobre a imagem da senhora/deusa de Fátima que nos remete para os cultos do Paganismo mais primitivo e cruel; e sobre o arranjinho do clero católico que tudo aquilo é, desde o princípio até hoje. Já não bastava o que fizeram os clérigos católicos ao tempo das chamadas “aparições”, e nos anos que se lhe seguiram; hoje, até já está a ser publicada, como abóbada de toda esta Mentira, uma obra, em vários volumes, pomposamente chamada Documentação Crítica de Fátima, realizada sob o “patrocínio científico” (!) da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, numa edição do Santuário de Fátima!!! Fica, assim, tudo em família clerical, como convém. Aliás, já das três crianças escolhidas em 1917 para serem “videntes”, duas delas eram irmãos entre si e as três eram primos uns dos outros, a viver porta com porta, filhas assustadas de duas famílias completamente dominadas pelos senhores abades, pelos confessores, e por aquele que depois veio a ser escolhido como primeiro Bispo da Diocese de Leiria, com a missão de reconhecer publicamente a “verdade” das “aparições” de Fátima. Mas prefiro terminar. E faço-o com as mesmas palavras com que terminei o e-mail que lhe enviei em Abril passado: “Ainda tenho esperança e por isso partilho consigo esta reflexão que [o meu querido Amigo e Irmão Bispo António Marto] avance para lá [Diocese de Leiria-Fátima] aberto ao Sopro de Jesus e que se deixe guiar por ele. De modo que, algum tempo depois de tomar posse, tenha a coragem martirial de denunciar/anunciar urbi et orbi a Mentira que Fátima é. Tenho a certeza que esse dia ainda há-de acontecer na nossa Igreja católica. Mas ficaria muito feliz se pudesse ver o meu Amigo Bispo António Marto como o profeta desse dia. Pense nisto. Para que a Alegria e a Paz o habitem, pelo menos, tanto como me habitam a mim. É tudo por agora. Desculpe a minha frontalidade. Mas rima com fraternidade. Fique então com o meu abraço de irmão na Fé, Padre Mário."
|
|
RELIGIÃO
Promessas e ópio?
Por Pe. Anselmo Borges (Professor de Filosofia na Universidade de Coimbra)
Jornal Fraternizar volta a transcrever com a devida vénia um magistral texto do Pe. Anselmo Borges, aparecido na edição de domingo 13 de Maio, do DN. Nele, o professor de Filosofia na Universidade de Coimbra evoca os cem anos de nascimento de António, Bispo do Porto, e brinda-nos com esta preciosidade teológica. Como vêem, já não estamos tão sozinhos no bom combate pelo Evangelho libertador de Jesus e por uma Fé decente.
Entendo - ou julgo entender - as promessas a Nossa Senhora de Fátima, ao Santíssimo Sacramento, ao Senhor dos aflitos ou aos santos. Habituadas a verem a sobrevivência, a saúde e a sua vida em geral dependentes de senhores e senhoras “omnipotentes”, egoístas, arbitrários e tiranos, as pessoas atiram para cima de Deus todos esses atributos. Então, como diante dos senhores deste mundo se põem de joelhos, oferecem como presente o que lhes faz falta, metem cunhas - como é que os pobres chegam a uma operação no hospital sem uma cunha? -, também fazem promessas a Deus e a Nossa Senhora, andam de rastos, oferecem sacrifícios, na esperança de que talvez desse modo Deus e a Nossa Senhora se comovam e tenham compaixão
Num diálogo com Óscar Lopes, em 1970, no Seminário da Boa Nova, Valadares, sobre a crise da fé, D. António Ferreira Gomes, cujo centenário do nascimento se comemorou no passado dia 10, deixou um pronunciamento polémico. Referindo-se à religião de Fátima, disse: “Sabemos que para baixo de Fátima ainda há todo o culto mágico que, tomado a sério, é uma ofensa profunda a Deus, porque na realidade a magia está a embotar o sentimento religioso do povo. A magia é uma vontade de encadear, de prender as forças sobrenaturais, consideradas mais como malignas do que como benéficas. Ora, isto, em relação à religião cristã, é a maior ofensa que se pode fazer a um Deus de bondade. Mas nós lidamos com isto, lidamos com a religião utilitária, do ‘dou para que dês’. Eu prometo, eu faço uma promessa para que Deus me faça isto ou aquilo. Faço um negócio, um contrato. E para quê? Evidentemente, para a vida, para a saúde, para o dinheiro, para isto tudo. Ora, isto, com muita piedade e muita fé no nosso povo, isto não é religião cristã de forma nenhuma.
Já antes, no início da sua intervenção, o então bispo do Porto - voltar ao seu pensamento é homenageá-lo no melhor sentido - referira que tinha uma definição de fé que achava muito boa. Ela encontrava-se numa cartinha breve em que Óscar Lopes lhe dizia que a sua participação na Mesa-Redonda (houve outros participantes, como Luís Moita e Bento Domingues) seria “um depoimento na primeira pessoa do singular acerca daquilo que durante 50 anos julgo ter crido a partir dum fervoroso catolicismo de infância. Apenas desejaria descobrir o melhor de mim mesmo no melhor catolicismo de hoje, e contribuir para tudo aquilo que deveras nos transcende”.
D. António comentou: “Eu tenho para mim que quem procura pôr-se deveras em relação com aquilo que nos transcende está numa atitude religiosa.” E, voltando-se para Óscar Lopes: “Desculpe, senhor doutor, se o ofendo.” E Óscar Lopes: “De modo nenhum!”
D. António constatou: “Nós sabemos que a maior parte da nossa boa gente não transcende.” E estava completamente de acordo com Óscar Lopes, ao referir a palavra de Marx sobre a religião, ópio do povo. “Segundo me pareceu, disse que Marx foi transformando um pouquinho o seu conceito, mas não penso que precisasse de reformá-lo, pois a religião é realmente muitas vezes ópio para o povo. A religião pode realmente ser ópio do povo. Não é uma palavra de insulto. Evidentemente, não é uma palavra ofensiva na medida em que se não refere ao cristianismo nem a Cristo que continua vivo no Espírito. Mas, repito, muitas vezes para o povo a religião no geral não significa nada de transcendente.”A atitude religiosa aparece, portanto, no movimento do transcender do homem para o transcendente. Onde se encontra então o que é próprio do cristianismo?
D. António afirmou que poderíamos adoptar a linguagem de Bonhoeffer, o teólogo protestante mártir do nazismo, e aceitar que o cristianismo não é religioso, na medida em que o Deus revelado em Cristo não serve para nos solucionar problemas insolúveis e os homens têm de arranjar-se autonomamente sem apelarem para Deus. O Deus cristão não é ópio nem um deus ex machina com que se negoceia promessas. Ópio e promessas - isso é o religioso que está para baixo.
“A religião cristã, entretanto, o limiar diferencial da religião cristã começa quando alguém se debruça sobre o outro, quando alguém se volta para o que o transcende, seja o outro neste mundo, seja Deus enquanto o Outro absoluto, sabendo que a relação ao Outro absoluto é exactamente também a relação ao irmão.”
O amor a Deus e o amor ao próximo são um só e têm de exprimir-se também na política. “Nenhum homem responsável da Igreja poderá dizer que não quer saber de política ou que nada percebe de política.”
|
|
EDITORIAL
É hora de regressarmos a Jesus, o de Nazaré
D. DINHEIRO
"Quando o Dinheiro/quer ser teu Deus/e te escraviza sem piedade/põe-te em guarda/dá-lhe combate/ou perderás tua Dignidade." O Alerta, feito poema, vem no meu recente livrinho Canto (S) nas Margens, e nunca foi tão oportuno como nestes dias de chumbo que estamos a viver no país e que nos estão a matar a alma e a devorar a nossa Dignidade de seres humanos.
Estes são os dias de glória e de exaltação do Senhor Dinheiro, de D. Dinheiro. Ele são OPAs a toda a hora; ele são jogos da Bolsa que fazem ricos da noite para o dia, sem que tenha sido produzida qualquer riqueza no país; ele são Euromilhões a fazer "excêntricos" todas as semanas (vejam a hábil Mentira da Publicidade que se limita a falar em "excêntricos", em lugar de "loucos", como a sugerir que a acumulação da Riqueza nas mãos de poucos não passa duma Excentricidade como outra qualquer, quando a verdade é que é um Crime de lesa-Humanidade, já que a Riqueza é para ser Repartida, segundo as necessidades de cada qual, pessoas e povos, nunca para ficar Retida e Acumulada nas mãos de alguns); ele são "directos" de banqueiros nas tvs a anunciar Lucros que insultam o País de Desempregados que hoje somos e deixam a nu toda a Crueldade de que o D. Dinheiro é capaz; ele são ordenados fabulosos de jogadores de Futebol que, ainda na sua natural imaturidade, perdem a alma e de repente passam de bons profissionais de futebol a gastadores compulsivos e craques sem um pingo de dignidade e de exemplaridade para os muitos adolescentes que têm neles os olhos e logo, por isso, são também tentados a crescer sem alma, bem à sua imagem e semelhança.
Esta é a hora do Poder das Trevas. Quando elevado à categoria de Senhor, de Deus, D. Dinheiro gera seres à sua imagem e semelhança, por isso, sem alma, o mesmo é dizer, sem entranhas de humanidade, cruéis, insolidários, Caim para os demais. As maravilhas que D. Dinheiro opera - e são muitas e de encher o olho - vão todas na linha da Descriação do Mundo e da Natureza e dos seres humanos. Ou D. Dinheiro não fosse o anti-Deus por antonomásia, o Inimigo n.º 1 de Deus vivo e Criador de Universos destinados a ser povoados e geridos por filhas suas, filhos seus, em estado de maioridade, irmãs, irmãos entre si.
Como é que chegamos a semelhante Descriação do Universo e dos seres humanos? A Liberdade veio ao mundo, mas nós preferimos o Império à Liberdade. Deixamo-nos fazer pela Mentira que é o Dinheiro Acumulado, em lugar de nos deixarmos fazer pela Verdade que é Jesus. Prosseguimos até hoje com a Religião e o Império, mesmo depois que uma e outro, coligados, mataram Jesus. E, para cúmulo, ainda corremos a fazer de Jesus crucificado o Deus do Império e do Templo que temos adorado, em lugar de nos atrevermos a ser mulheres, homens com o mesmo Sopro ou Espírito dele.
É hora de arrepiar caminho e regressarmos a Jesus, o de Nazaré. E às suas causas, que são as da Humanidade, a começar pela mais oprimida e empobrecida. Ousemos ser pobres por opção, como ele foi. Partilhar os bens e a vida, como ele partilhou. Assumir o Mundo e a Vida nas próprias mãos, em comunhão fraterna e solidária, como ele assumiu. Ser irmãs e irmãos que se amam, perdoam e vivem a comunhão em redor de Mesas comuns e eucarísticas, como ele foi e viveu. Numa palavra, deixemos Deus Vivo, não o D. Dinheiro, ser Deus em nós e connosco, como ele sempre deixou.
|
|
EDITORIAL
Futebol em vez de Poemas
InDiário Aberto www.padremariodemacieira.com.sapo.pt
O futebol continua a ser tratado pelos
media na local Desporto. Deveria passar
para a local Economia/Finanças. Desde
que o Dinheiro entrou no futebol nunca mais
houve desporto. O negócio é descarado. E
os jogadores tornaram-se coisas de compra
e venda. Prostitutos. Os mais caros do Mercado.
Ele é a Liga. Ele é a Selecção nacional.
Ele é o campeonato da Europa e o do
Mundo. Ele é a Taça das Taças e a Liga
dos Clubes Campeões Europeus. Em
todo o lado está o selo do D. Dinheiro. A
loucura do Mercado. Com multidões a
aplaudir. A pagar. E a perder a dignidade.
Desporto é cultura. É desenvolvimento. É
prática de grupo. É fraternidade/sororidade.
É comunhão. É gratuidade. É convívio com
a Natureza. É saúde. É festa. Viva o Desporto!
Vieram as SADs e tudo perverteram. Mataram
o Desporto. E matarão as populações que
insistam em frequentar tão macabra liturgia.
Os campos de futebol são arenas. Os que
correm atrás da bola são putos a quem o
D. Dinheiro transtorna a cabeça e rouba
a alma para os poder utilizar como peças
do Mercado. Os empresários são traficantes
de jogadores pagos a peso de ouro. O que
será do mundo se acabar reduzido a Futebol?
Nunca entrei num estádio de futebol. São
outras tantas Catedrais onde o D. Dinheiro
humilha milhões de seres humanos. Temos
fome de beleza e de cultura. De paz e de
bem-estar. Aspiramos a mais humanidade e
festa. Servem-nos Ópio e Alienação que nos
deixam ainda mais vazios e desmobilizados.
Ganharás o Pão com o suor do rosto diz a
palavra de ordem da Vida que nos quer ver
passar de condições menos humanas a mais
humanas até chegarmos à comunhão de bens
em redor de mesas comuns experimentadas
como verdadeiras frátrias. Mas logo o Futebol
do D. Dinheiro chegou e roubou-nos esta via.
Calculem as horas que os media gastam com
o Futebol do D. Dinheiro. Contem as empresas
que engordam à sua custa. Reparem no empenho
dos sucessivos governantes de turno. Tudo hoje gira
em função dele. O país falece à míngua de Poesia.
De trabalho com direitos. E de crianças. Mas que
importa se há a selecção do senhor Scolari?!
Acordemos! O Dinheiro ataca-nos hoje por
todos os lados e de todos os modos. E só pára
quando nos arrebatar a alma. Cuidado! Ele é
o nosso pior inimigo. Ou lhe resistimos com toda
a nossa mente e com todas as nossas forças e
permanecemos humanos com humanos. Ou
acabamos a comer Dinheiro como o Mourinho!
Resistamos-lhes com todas as nossas forças
Os senhores do Dinheiro que são também os donos dos grandes media nacionais e mundiais não conhecem, nem querem conhecer, muito menos alimentar a face mais genuina dos seres humanos. Apenas a sua face perversa. É na face perversa dos seres humanos que eles apostam tudo. Todos os seus recursos. Toda a sua inteligência. Todo o seu tempo. Todas as suas capacidades. São perversos e, como tal, só se sentem bem a lidar com a face perversa dos seres humanos. A única que lhes garante êxito material. Sucesso sem fim. E também a adoração permanente de (quase) toda a gente que os rodeia. Acabam até a pensar que já não são seres humanos como os demais; que são deuses. E deuses são. Falsos, mas deuses. Cruéis, mas deuses. Perversos, mas deuses. Criadores de perversão e de perversos, mas deuses.
Nunca, desde que o mundo é mundo, os senhores do Dinheiro chegaram tão longe como hoje em poder, domínio e fascínio. E também em adoração, por parte dos outros seres humanos. Mesmo assim, o que hoje nos é dado ver é apenas o começo do poder, domínio e fascínio dos senhores do Dinheiro. A menos que nós, os seres humanos, contra todos os prognósticos, caiamos na conta de que estamos cada vez mais nas garras e nas algemas dos senhores do Dinheiro e lancemos o nosso planetário grito do Ipiranga pela liberdade e pela dignidade. Trata-se duma Revolução absolutamente necessária, mas que, para nossa desgraça, está ainda muito longe de aparecer no horizonte. O que hoje aparece no horizonte e recolhe aplausos generalizados é a Descriação dos seres humanos, conduzida cientificamente e com toda a crueldade pelos senhores do Dinheiro. E pelos seus grandes media. O que está hoje em curso no mundo é a Descriação Total dos seres humanos. Concretamente, da sua face mais genuína. Com o objectivo de que os seres humanos venham a ser apenas a sua face perversa. Piores que os animais da selva. Robots. Corpos sem entranhas de humanidade. Puros computadores entre outros computadores. O sucesso desta operação de Descriação está à partida garantido, porque não encontra opositores à altura. Nem nas Igrejas, nem nos Partidos de Esquerda. As Igrejas, porque crucificaram de novo Jesus e agora passam todo o seu tempo a adorá-lo na cruz. Sem quererem saber para nada do seu Evangelho de libertação para a liberdade, que, aliás, até acham fora de moda e obsoleto. À missão Evangelizar os pobres que lhes foi confiada por Jesus, preferem a rotina diária da venda de ritos religiosos nos templos e a pregação de moralismos cheios de ranço. Os partidos de Esquerda, porque tiveram acesso a alguns dos privilégios dos senhores do Dinheiro e agora, quais adolescentes de internatos dirigidos por frades ou freiras que de repente viram uma mulher nua, nem que seja só em fotografia, já não querem outra coisa. E só não se passaram já todos com armas e bagagens para as multinacionais dos senhores do Dinheiro, por pudor e uns restos de vergonha. Mas já é lá que têm o seu coração, a sua mente, os seus desejos. E sobretudo os filhos, as filhas.
Contra os senhores do Dinheiro e os seus grandes media, erguem-se, hoje e sempre, Jesus e o Evangelho de Deus Criador de seres humanos à sua imagem e semelhança. Temos por isso que regressar a Jesus. E ao seu Evangelho. Pessoalmente e em grupos de dois ou de três, de vinte ou de trinta, de dois mil ou de três mil. Ao contrário dos senhores do Dinheiro que apostam tudo na face mais perversa dos seres humanos, Jesus aposta tudo, até a sua própria vida, na face mais genuína dos seres humanos. Puxa por ela e alimenta-a com a sua própria vida feita Pão e Vinho. E Palavra animada de Sopro libertador para a Liberdade e para a Responsabilidade. O mesmo é dizer, para a Política como entrega da nossa própria vida pela vida do mundo.
Tornemo-nos então surdos aos media dos senhores do Dinheiro. E, se ainda lhes dermos atenção, que seja para fazermos sempre o contrário do que eles dizem. Eles estão aí seriamente apostados em tornar-nos tão perversos quanto os seus donos. Nós, na pobreza imerecida; eles na riqueza acumulada e concentrada. Mas perversos, todos. Resistamos-lhes com todas as forças. E abramo-nos de par em par ao Espírito de Jesus que nos quer fazer tão humanos quanto ele. Tornemo-nos suas discípulas, seus discípulos. Na prática alegre da Partilha dos bens. E no amor sororal/fraterno. Sempre em diálogo maiêutico, libertador, uns com os outros. Na paz revolucionária. E no perdão.
Mário, presbítero da Igreja do Porto
|
|
ESPAÇO ABERTO
Não aceitamos heranças
Declarações do Pe. Baptista, do Calvário de Beire,
ao Jornal O ARRIFANA, Março 2006
P. Com que finalidade foi criado O Calvário? E para que tipo de pessoas?
R. Para doentes sem cura e sem família. Aliás, quando deram esta quinta ao Pe. Américo já foi um bocadinho com esse sentido. Ele já sentia a pressão dos doentes, porque visitou sempre doentes pobres e chegou à conclusão de que havia alguns que, se não fossem acolhidos, morreriam por lá como animais. E foi com o intuito de dar uma resposta a essas necessidades mais prementes, todos doentes incuráveis e que não tinham sequer onde morrer, que o Calvário foi criado. “Vou dar-vos uma cama para poderem morrer condignamente”, dizia ele. E começámos a obra, embora o Pe. Américo não tivesse chegado a ver o Calvário a funcionar.
P. As pessoas permanecem aqui por quanto tempo?
R. Nós não somos como as instituições em geral. Nós temos tempo. E aqui somos uma família. Ora, a família gere a vida dos seus membros duma maneira diferente das outras instituições que não se concebem como família. Todos os que a Lei permite que venham são recebidos. Infelizmente, agora não nos deixam receber crianças. Temos que nos contentar com as crianças que temos cá. Porque uma família normal tem crianças, adultos e velhos. Os que vêm ficam na família até ao fim da sua vida. Aqui não se manda ninguém para a rua. Dos rapazes que entraram nesta casa doentes, muitos deles conseguiram recuperar e entraram num regime normal, apesar de limitados intelectualmente. São já umas duas centenas que regressaram à sociedade. Alguns emigraram, outros casaram e levam uma vida perfeitamente integrada. Os que permanecem aqui, não têm as mesmas capacidades e vão ficar connosco até ao fim dos seus dias. Há pessoas que vivem aqui há 47-48 anos, desde os seus 5-6 anos. Até criei um cemitério lá em cima no monte, para serem nele sepultados os seus corpos.
P. Como é que as pessoas doentes vêm para cá? Através das famílias ou das instituições?
R. Cada doente tem a sua história. Alguns aparecem, eles próprios, a pedir para ficarem cá. Outros, por terem famílias numerosas. Outros, são os párocos ou as Conferências Vicentinas que os encaminham para cá. Havia também muitos pedidos da Segurança Social, todos os dias, mas agora não. Cada doente tem a sua história. Lembro-me de três que vieram com 6 meses e um deles esteve cá até aos 45 anos. Nunca andou, movimentava-se numa cadeira de rodas e lentamente começou a fazer uma vida quase normal. Era uma espécie de ajudante dos outros, apesar da sua limitação. Era ele quem dava de comer aos bebés. Às vezes, substituía-me. Por vezes, não havia ninguém para acompanhar lá em cima e ele ajudava as raparigas a acabar os trabalhos manuais. Ele tinha jeito para tudo, até para tricot. Fazia coisas espantosas. Só aos 12 anos é que teve a visita da mãe. Foi abandonado no Hospital dos Capuchos. Com ele, vieram mais três bebés na mesma altura. Um deles era uma miúda que veio de Fafe. Eu soube da situação e fui dar com ela em cima de um monte de esterco, nua, com fome e cheia de frio. Entrei na casa e dei com a mãe num estado de tal degradação, que acabei por a trazer também. A mãe morreu 15 dias depois e a filha continua viva, já com 46 anos. Com 6 anos, ainda só pesava 4 quilos, não tinha nem olhos, nem cabelo, nem dentes. Nunca tinha tomado leite até aos 6 anos e por isso estagnou nos 4 quilos. Mas geneticamente era perfeita. Tanto que, depois, contra todas as indicações médicas, começou a crescer. Um ano depois de cá estar, já pesava 26 quilos e hoje é uma pessoa normal. Vive num quarto só dela e ajuda os outros. É muito inteligente e, embora com limitações físicas, consegue fazer a sua vida normal, deslocar-se e ajudar os outros no que for preciso, ela a que, aos olhos de muitos, é a que mais precisa! Foi quase uma ressurreição. Mas o Calvário é sobretudo para acompanhar doentes incuráveis, não tanto para recuperar doentes. E doentes incuráveis são já centenas que passaram por cá. Já recebi doentes cancerosos, um dos quais veio duma pocilga da zona do Porto, nas proximidades da Igreja da Lapa. De pocilgas, trouxe vários, assim como de galinheiros. Uma doente vivia presa dentro de um galinheiro, com um colchão no chão, como um animal. Havia muitas pessoas em cortes. Hoje, parece estranho, mas se formos a ver, ainda há casos destes. Só que se escondem. Ora, foi para doentes desses que nós abrimos o Calvário e o mantemos a funcionar.
P. Então para se entrar aqui não é preciso ter bens?
R. Pelo contrário, para nós, ter bens é um empecilho para entrar. Lembro-me de um homem que uma vez me apareceu e que queria cá ficar. Eu já estava disposto a recebê-lo, quando ele disse: “Sabe, eu tenho no banco…”, já não me lembro quanto era, mas era muito e logo eu exclamei: “Ai o que você me disse!” E já não o recebi. O homem ficou impressionado, mas eu tive escrúpulos em o receber.
P. Porquê?
R. Nós temos pobres e mais pobres e como ele tinha alguns bens, eu tinha remorsos de o acolher e deixar pobres de fora. Nós somos ao contrário das outras instituições. Não vale a pena tentar entender-nos. Somos assim. Queremos aqueles que não têm nada. Hoje toda a gente tem a sua pensão social, mas para nós não conta. Preferimos os mais pobres. O dinheiro para a Obra vem de outros lados. É uma questão de perspectiva e de fé.
P. Tem havido pessoas a fazer doações em testamento?
R. Sim, tanta gente e a toda a hora. Mas temos recusado. Não aceitamos heranças. Já nos ofereceram quintas para fazermos um segundo Calvário, em Lisboa, mas nós não temos capacidade para isso. E não queremos multiplicar o património, pelo contrário, queremos apenas o pão nosso de cada dia. Tem havido oferta de heranças muito grandes, mas nós não as aceitamos. Só aceitamos o que a pessoa dá, ela própria, não o que ela deixa em herança. Assim o dinheiro é dinheiro duma pessoa viva. Dinheiro que a pessoa deixa em herança para depois nos ser entregue é um dinheiro morto e nós não o queremos. Temos tido algumas dificuldades em libertar-nos desses testamentos. E quando de todo em todo não conseguimos, então ficamos com as coisas, mas para as darmos a outras instituições. Aqui há tempos, ofereceram-nos uma casa com uma quinta e nós oferecemo-la à Misericórdia de Aveiro. E isso tem acontecido muitas vezes. Não queremos acumular, pelo contrário, queremos repartir.
P. Que actividades desenvolve esta família que vive no Calvário?
R. Tudo o que podemos fazer fazemos. Tenho como norma de vida que aquilo que um doente possa fazer ninguém o deve fazer por ele. As pessoas que aqui vivem ocupam-se fundamentalmente das tarefas domésticas do dia a dia, desde ajudar na cozinha, pôr as mesas, ajudar a dar de comer às pessoas que não conseguem comer por si, e fazer as camas. As pessoas que podem fazem trabalhos cá fora, a tratar dos jardins da casa. Tudo como numa casa dita normal. O fundamental é a entreajuda na vida da casa. Todas as pessoas que têm capacidades põem-nas a render. E por vezes descobrem-se capacidades que estavam escondidas, ou eram menosprezadas. Aqui procuramos que as pessoas descubram as suas capacidades e as ponham a render. E a verdade é que acabam por se equilibrar psicologicamente através das actividades a favor dos demais. Há os medicamentos, evidentemente, mas a grande medicação para o equilíbrio psicológico dos doentes é a ocupação no trabalho e na dedicação aos outros. A melhor maneira de andarmos equilibrados é esquecermo-nos de nós mesmos e pensar nos outros. Por isso é que há um equilíbrio psicológico muito grande aqui em casa. A própria Natureza e a ocupação nos jardins dão um equilíbrio muito grande. Mas hoje o mundo vive contra-natura. Se repararmos, a Natureza repousa no Inverno, o Inverno é o seu repouso. E as pessoas o que fazem? Vão para férias no Verão, quando a Natureza está pujante. Deveria ser ao contrário. As férias grandes deveriam ser no Inverno, quando toda a Natureza está em repouso.
|
|
A educação desportiva
Por Manuel Sérgio (Reitor do Instituto Piaget)
Ao Congresso do Desporto, organizado pela Secretaria de Estado da Juventude e Desporto, que findou no passado dia 18 de Fevereiro, apresentei a seguinte proposta:
1. Um Desporto que não seja apenas uma actividade física, mas também consciencializada por problemas sociais e políticos. Os efeitos preventivos e curativos da motricidade humana, na forma de jogo e desporto, no que respeita a diversas patologias, são indiscutíveis. Só que uma abordagem sistémica do Desporto atribui grande importância ao esforço físico, mas não esquece que o ser humano só se realiza, para além do físico, tendo em conta a complexidade humana que é corpo-mente-desejo-natureza-sociedade
2. O Desporto deve considerar a questão dos valores. “Os valores do mercado penetraram em sectores da sociedade a que anteriormente presidiam, condições de não mercado” (George Soros, “A Crise do Capitalismo Global”, Temas e Debates, Lisboa, 1999, p. 105). Ora, a vocação do Desporto é ética, antes do mais. O Desporto (repito-me) não radica, unicamente, em princípios biológicos, como cartesianamente se pensou. O ser humano é um animal político... até a fazer desporto!
3. “Método e teoria são interdependentes. A metodologia, por simples ou básica que seja, depende de um conjunto de supostos teóricos. Por exemplo, a recolha de dados sobre o desporto requer (...) uma definição de desporto de modo que, antes do mais, ela esteja presente em tudo o que se faz. Sem esta orientação conceptual, não há parâmetros, nem fronteiras, nem limites” (Kendall Blanchard y Alice Cheska, “Antropologia del Deporte”, ediciones bellaterra, s.a., Barcelona, 1986, p. 43). Para mim, o Desporto, como motricidade humana e como moral em acção, é epistemologicamente um dos aspectos de uma nova ciência humana e politicamente visiona o nascimento de um novo socialismo, que se confunde com uma democracia participativa e uma economia distributiva.
4. “O jogo é menos um divertimento que uma atitude fundamental e mesmo específica da existência humana (...). Com efeito, como já o mostrou Huizinga, quase tudo é jogo na existência humana” (Nicolas Grimaldi, “Traité de la banalité”, PUF, Paris, 2005, pp. 155/156). Se quase tudo é jogo na existência humana, o jogo (e por extensão o desporto) tem a ver com quase tudo o que é humano. Daqui se infere que os curricula dos cursos de Ciências do Desporto estão ultrapassados e há, neles, novos saberes a estudar. O Desporto, quando é só uma actividade física, transforma-se normalmente num espaço donde normalmente despontam pessoas acéfalas e acríticas. O que pode acontecer com os programas das aulas de Educação Física, no Ensino Secundário.
5. Substituição, no Básico e no Secundário, da disciplina de Educação Física, pela de Educação Desportiva que integraria, administrativamente, a Educação Física e o Desporto Escolar. E digo, administrativamente, porque conceptualmente tudo deveria repensar-se. Se as aulas de Educação Física se resumem a prática desportiva (sabem o que resta de uma aula de Educação Física, sem uma bola? Quase nada!); se é do conhecimento generalizado que estas aulas não educam físicos, mas pessoas em movimento intencional a Educação Física “desportivizou-se” e, portanto, até aqui deixou de existir! Por outro lado, atendendo ao carácter educativo do Desporto que, se for entendido como um dos aspectos de uma nova ciência humana, não tem par, no cotejo com as demais disciplinas, sugere-se a criação da Educação Desportiva, como disciplina opcional, em todos os cursos universitários
Dizia Lenine que “nada é mais prático do que uma boa teoria”. Assim, em nome de um Desporto e de uma Sociedade diferentes, invoco a necessidade de uma Educação Desportiva que, em movimento intencional, se transforme numa Educação Problematizadora. Na Escola, no Clube, na Reabilitação, na Saúde em geral, no Espectáculo, na Universidade, o Desporto não pode destinar-se a adormecer as pessoas à recusa da sociedade injusta estabelecida. A revisão curricular das licenciaturas em Ciências do Desporto, acompanhada de uma crítica epistemológica e política, poderia ser o princípio da transformação que se anseia, em ordem à construção de um mundo novo. Mas, infelizmente, continuaremos a ensinar aos alunos uma “teoria e metodologia do treino” que nada tem a ver com a transformação da sociedade e da história. O Desporto é, hoje, o fenómeno cultural de maior magia. Mas, para alguns, parece destinar-se tão-só a fazer “bestas esplêndidas”. E, pior ainda, reproduz e multiplica, demasiadas vezes, a alta competição em que se desentranha o neoliberalismo dominante. Em Portugal, antes da Revolução dos Cravos, acusava-se o salazarismo de ser a “causa das causas” dos três éfes (Fado, Fátima e Futebol). Hoje, continuamos na mesma. Não somos contra o Desporto. Bem pelo contrário! Mas que ele se transforme na expressão corporal do desenvolvimento sócio-económico do nosso tempo, pois que tem virtualidades para tanto!
|
|
Evangelho de Judas
Por Leonardo Boff (Teólogo brasileiro)
Judas Iscariotes era um apóstolo de Jesus, portanto, alguém de sua intimidade. Mas segundo São João “era ladrão; tirava dinheiro da bolsa comum”(12,5). Denunciou às autoridades, ao preço de trinta moedas de prata, onde Jesus estava escondido e com um beijo na sua face identificou-o para os soldados e assim o traiu. Depois, arrependido, quis devolver o dinheiro, o que não foi aceite. Desesperado, enforcou-se, segundo São Mateus (27,3-5). Segundo a fala de São Pedro nos Actos dos Apóstolos, sofreu um acidente, “arrebentou-se ao meio derramando todas as vísceras”(1,18).
Por volta do ano 100, segundo Papias, discípulo do evangelista João, Judas “teria inchado de forma monstruosa, apodrecendo vivo”. Como se depreende ninguém sabe direito seu fim trágico. Mas todos o consideram “o traidor”.
Para a Igreja antiga sempre foi um enigma: por que Judas traiu o amigo? Muitas são as teorias. A mim convence-me uma bastante aceite na exegese ecuménica, pois guarda certa coerência interna. Ela reza assim:
Predominava no tempo de Jesus uma visão do mundo chamada apocalíptica. Segundo ela, o fim do mundo estaria iminente. O Reino irromperia, pondo fim a esta desgraçada existência. Mas antes haveria o grande embate com o Anti-reino e os seus asseclas. O Messias seria submetido “à grande tentação”. Quase morreria. Mas na hora suprema Deus interviria, salvaria o Messias e inauguraria o Reino.
Junto com outros estudiosos, comungo da ideia exposta nos meus livros Paixão de Cristo-paixão do mundo e Pai Nosso que Jesus se inscrevia dentro desta visão. Ele fala do fim iminente e do Reino que já está dentro de nós. Usa expressões técnicas quando se refere à “tentação”, à “hora” e ao “beber o cálice”, coisa que lhe produz angústia mortal, a ponto de suar sangue e rezar:”Pai afasta de mim este cálice”.
Os apóstolos participavam desta leitura do mundo. Judas, nesta lógica, no afã de acelerar a vinda do Reino, entregou Jesus para pô-lo em grande aperto e assim obrigar a Deus a intervir. Nesta compreensão, Jesus mesmo no alto da cruz, na cercania da morte, se dá conta de que Deus não intervém como esperava. Grita estas terríveis palavras: ”Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?” (Marcos 15,34). Mas sua última palavra foi: “Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito” (Lucas 23,46). A traição de Judas seria portanto um acto teologicamente fundado, para acelerar a vinda do Reino.
Bem outra coisa diz o Evangelho de Judas, manuscrito de 13 páginas em papiro, originalmente escrito em grego antigo e depois traduzido para o copta, por volta do final do século III e inícios do IV. Portanto cerca de 150 a 170 anos após a morte de Judas.
Descoberto nos anos 70 no Egipto, só recentemente foi decifrado e publicado. O texto principal traz a fala de Jesus a Judas: “Tu ultrapassarás a todos os outros (apóstolos); tu sacrificarás o homem que me serve de roupagem; eu te ensinarei os mistérios do Reino; mas por isso tu sofrerás muito”.
O contexto é do gnosticismo, uma corrente filosófico-existencial que negava valor ao corpo e à carne. Jesus aqui deveria libertar-se desse envelope carnal para revelar sua divindade. Essa seria a missão de Judas.
Uma tal doutrina está longe do espírito dos evangelhos que afirmam a carne que Deus fez sua. Santo Ireneu, bispo de Lyon, no ano 180, conhecia esse evangelho de Judas e denunciou-o como ficção. Mas o manuscrito depois sumiu. Por melhores que tenham sido as razões de Judas, ele foi o traidor e continua Judas.
|
|
O Evangelho segundo Barrabás
Por Frei Betto (1) (Teólogo brasileiro)
Todos sabemos que a choldra, como diria Elio Gaspari, preferiu libertar Barrabás e condenar Jesus, como narra o Evangelho. Os romanos ocupavam a Palestina no século I; suas leis previam que, por ocasião da festa judaica da Páscoa, um prisioneiro seria indultado. O curioso é que horas antes, à entrada de Jerusalém, a multidão havia aclamado Jesus: “Bendito o filho de David! Bendito o que vem em nome do Senhor” (Lucas 19,38).
Jesus Barrabás (sim, assim se chamava o nosso homem) era discípulo de Judas, o Galileu, líder do partido dos sicários que, acusado de promover uma rebelião contra os impostos cobrados por Roma, morreu crucificado quando Jesus se encontrava na adolescência. Sobre Barrabás pesava a acusação de ter matado um soldado romano no outono anterior, o que lhe angariava simpatias aos olhos dos judeus contrários à ocupação romana.
A multidão teria sido assim tão volúvel? Porque entregar agora à condenação aquele que havia saudado, ao vê-lo entrar no Templo pela Ponte de Xisto, montado num jumento? Tudo faz supor que a turba que acolheu Jesus como sucessor do rei David, hasteando palmas, não era a mesma que se encontrava na Fortaleza Antónia, onde ele foi julgado por Pilatos. Faz sentido. Na via pública, junta-se qualquer um. Nas dependências de um edifício que servia de palácio ao governador romano só ingressavam os credenciados, os “amigos da casa”. E com certeza não eram pessoas dispostas a contrariar as autoridades.
Jesus intriga-nos. Ele é o anti-herói. Jamais escreveu um livro, actuou apenas durante três anos, entrou na história pela porta dos fundos, desafiou as autoridades do seu tempo. Se os homens sonham em ser reis e os reis gostariam de ser deuses, em Jesus Deus fez-se homem. Ninguém marca tão profundamente a cultura ocidental quanto o Nazareno. “Ainda que me provassem que a Jesus não estava com a verdade, eu ficaria com Jesus”, declarou Dostoievski.
A existência do filho de Maria e de José dá asas à imaginação. Não só agora com O Código da Vinci, de Dan Brown, um Harry Potter para adultos. Já nos primeiros séculos da nossa era, uma centena de evangelhos foi publicada, atribuídos a Pedro, Tomé, Filipe, Matias, Barnabé, Maria Madalena etc. Agora vem a público um de suposta autoria de Judas, cujo autor procura salvar a sua má fama, tentando justificar que o apóstolo-tesoureiro teria agido de comum acordo com Jesus. O bispo Gelásio, falecido em 496, publicou um texto conhecido por Decreto Gelasiano, no qual condena ao menos 60 textos considerados apócrifos. Na lista não aparece o Evangelho de Judas, sinal de que não devia ser muito popular.
Não duvido que surja amanhã o Evangelho de Jesus Barrabás. O agitador teria deixado um relato no qual afirma que sua prisão fora uma farsa montada para apressar a condenação de Jesus. Ou que seu indulto foi comprado a peso de ouro por seus companheiros sicários, pago a um Caifás corrupto, o mesmo que repassou as trinta moedas a Judas, e que teria insuflado a turba contra Jesus.
Acho curioso constatar que muitos indagam “quem foi Jesus?” e “quem matou Jesus?”, quando as perguntas pertinentes são “o que fez Jesus?” e “porque condenaram Jesus?” Dessas interrogações muitos fogem como o diabo da cruz. Sabem que as atitudes de Jesus com as suas críticas à ganância dos ricos, a sua exigência de amar os inimigos, são no mínimo desconfortáveis para uma sociedade centrada no sonho da opulência, canonizadora da apropriação privada da riqueza e prenhe de ódio frente aos adversários.
Jesus foi assassinado como prisioneiro político, não por ter sido traído ou porque Deus, Pai sanguinário (na versão de Mel Gibson), se quis comprazer ao ver o Filho contorcer-se na cruz. A pena de morte adoptada pelos romanos, a crucificação, atingiu Jesus, porque sua militância ameaçou a estabilidade do regime político e económico vigente na Palestina. “Não compreendeis que é melhor que só um homem morra pelo povo, do que perecer toda a nação?”, indagou o Sumo Sacerdote (João 11, 50).
Somos cúmplices de Barrabás quando acorrentamos o Jesus que nos habita e os valores evangélicos paradigmáticos de uma ética fundada no respeito à sacralidade do próximo e da natureza, e quando preferimos a competitividade à solidariedade, a vingança à compaixão, o ódio ao amor. Eis uma maneira muito em voga de escrever o Evangelho segundo Barrabás.
|
|
O Silêncio de Deus
Por Frei Betto (2)
Na visita a Auschwitz, o papa Bento XVI fez uma prece que surpreendeu a muitos: “Onde estava Deus naqueles dias? Porque ficou em silêncio? Como pôde permitir esse massacre sem fim, esse triunfo do mal?”
Esta foi a oração de Jesus na cruz: “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?” (Mateus 27, 46), fazendo eco ao Salmo 22: “Meu Deus, eu grito de dia e não me respondes; de noite, e nunca tenho descanso.”
Nem sempre a nossa oração é de súplica, gratidão ou louvor. Há momentos em que o silêncio de Deus nos incomoda, sobretudo diante do mal praticado e da impunidade. Talvez Ele esteja sugerindo, com esse silêncio, caber a nós reparar a injustiça e evitar o mal. Deus é pai mas não paternalista. “Onde estavam vocês, homens e mulheres de bem, naqueles dias? Porque se demitiram?”
A religião não é para ser crida, é para ser vivida. Mais vale fazer do que crer; amar ao próximo do que prestar culto a Deus. Mas quem, hoje, prescinde de religião? Como celebrar momentos fortes da vida nascimento, casamento, morte sem recorrer a ritos e símbolos religiosos?
Muitos já não buscam a libertação social e política, devido ao ocaso das ideologias progressistas, embora sonhem com um mundo melhor. Agora a libertação cede lugar à salvação. A utopia situada no futuro da história é suplantada pela experiência imediata do sagrado.
As instituições tópicas da modernidade estão em crise, como a família monogâmica, a escola e a igreja. Nunca Protágoras esteve tão em moda como nesse primórdio da pós-modernidade. Também quanto à religião os fiéis querem ser a medida de todas as coisas. Rejeitam os canais institucionais de mediação com o divino. Olham desconfiados para instituições aferradas ao equívoco histórico de que sempre coincidem autoridade e verdade.
Daí o êxodo de fiéis das igrejas históricas às variadas manifestações esotéricas. Não estão à procura de doutrina, mas de alívio e soluções para os seus problemas existenciais. Não buscam mandamentos, e sim consolos. Não querem o perdão, mas explicação para as suas angústias e dificuldades. À promessa de salvação pós-morte preferem o guru capaz de premonição frente ao futuro imediato. Ficarei curado da doença? Meu filho largará as drogas? O amado retornará aos meus braços? Há videntes que garantem, em seus anúncios, a volta em três dias do amor perdido ou a devolução do dinheiro da consulta...
Nas grandes cidades há muita insegurança. O ritmo da vida acelerou-se e não bastam pão e pouso para se ser feliz. O nível de exigência inclui riqueza, fama e beleza (sobretudo magreza). O ser robótico esculpido pelos media acentua a baixa auto-estima. Como me posso sentir feliz se tenho dívidas, sou anónimo, desprovido de beleza física e não me consigo conter diante de um caldeirão de gorduras saturadas e uma travessa de doces? Como sentir-me bem se estou ameaçado pelo desemprego? E se a política não me dá respostas e as ideologias se calam, onde buscar refúgio senão no esoterismo religioso? Como resistir ao pastor que me promete prosperidade em troca de uma vida menos desregrada e o dízimo pago em dia? Como não se sentir atraído pelo padre que me insere entre os eleitos do Espírito Santo e me faz falar em línguas estranhas?
As igrejas históricas dividem-se entre as que ainda não se urbanizaram e insistem nos mesmos arcaicos métodos paroquiais, sem recursos para evangelizar a juventude, os sectores profissionais, os movimentos sociais, e aquelas que, actualizadas pelos media televisivos, “privatizam” a fé, reduzida a um meio de consolo pessoal e identificação do fiel com a sua igreja. Toda a dimensão social encontrada no Evangelho o compromisso de Jesus com os mais pobres, a crítica aos opressores e vendilhões do Templo, o amor ao próximo que reconhece nos famintos a própria face do Cristo é ignorada.
Assim, a religião exerce, de um lado, o papel de legitimadora da desordem vigente na sociedade e, de outro, induz ao fundamentalismo que acredita na partidarização política da igreja como única forma de salvar a sociedade...
Evangelizar, hoje, é resgatar os métodos adoptados por Jesus: antes de proferir o discurso moralista, oferecer o absoluto de Deus, como fez ele à samaritana; antes de exigir adesão à doutrina, propor a opção pelos pobres, como disse ele ao homem rico; antes de realçar a sacralidade das instituições religiosas, acentuar o ser humano, em especial o faminto, o enfermo e o oprimido, como templos vivos de Deus. E anunciar o Deus do amor e do perdão, e não do juízo e da condenação; o Deus da alegria, não da tristeza; Deus como pão da vida, e não cruz a ser carregada neste vale de lágrimas...
Jung demonstrou como Jesus está presente no inconsciente colectivo do Ocidente. O que explica o sucesso do Código Da Vinci que, supostamente, esclarece a “história da vida privada” de Jesus. Essa tendência à privatização de todos os aspectos da vida, comprovada pelo êxito de publicações que aparentemente fazem o leitor penetrar na intimidade de celebridades, é uma das características da filosofia neoliberal que respiramos em tempos de unipolaridade do capitalismo. Esse voyeurismo exacerbado neutraliza o nosso potencial de transformar a sociedade e resgatar a nossa auto-estima como seres ontologicamente políticos, como observou Aristóteles.
Diante da tanta injustiça, não é o silêncio de Deus que nos deveria incomodar, e sim a nossa desmotivação para combatê-la e construir o “outro mundo possível”.
|
|
A prática teológica das mulheres
ajudará à compreensão do Evangelho
Prefácio do Pe. Anselmo Borges ao livro
Teologia e Género, edição Ariadne
Prefácio quer dizer feito antes, portanto, é o que precede o texto propriamente dito, já terminado. Mas, se é escrito no fim, também a sua leitura deveria seguir essa ordem do fim para o princípio , estimulando a releitura aprofundada da obra. Embora não seja uma conclusão, um prefácio é na realidade sempre posfácio.
Um prefácio pode ter essencialmente duas funções. Uma delas é servir de introdução à obra apresentada. No caso vertente, essa apresentação já existia, numa síntese acabada que o prefaciador não teria conseguido. A outra seria a de um propósito laudatório. Mas também essa intenção aqui se não justifica, como o leitor desta obra pioneira entre nós poderá constatar por si próprio. Assim, neste pré-texto, pretende-se tão-só, aproveitando o pretexto duma obra inaugural entre nós sobre teologia e género, apresentar modestamente alguns pontos de reflexão sobre uma temática tão urgente como complexa.
Teologia é o discurso sobre Deus que se revela, portanto, dentro do círculo hermenêutico do “crer para entender e entender para crer”, compreensão da fé enquanto entrega confiada ao Mistério vivo e pessoal que salva. A fé não abandona o logos, pois, embora não seja a conclusão lógico-empírica da razão, exige que dê razões de si mesma. Sendo um acto pessoal de entrega do Homem todo em todas as suas dimensões, implicou sempre a presença da teologia. Por sua vez, a teologia só desempenha a tarefa que é a sua, se, como escreveu Hans Küng, se mantiver fiel a duas constantes ou pólos, em “correlação crítica”: a primeira constante, pólo ou horizonte é o nosso mundo presente de experiência, na sua ambiguidade, ambivalência, contingência, mutabilidade; a segunda constante, pólo ou norma fundamental é a tradição judaico-cristã, que, em última análise, tem o seu fundamento e expressão na mensagem do Evangelho de Jesus Cristo.
A revelação não cai directamente do céu. Ela dá-se em experiências e com experiências humanas. Por conseguinte, o próprio Evangelho mesmo na origem nunca é apresentado puro, pois, dado que o ser humano é, por natureza, cultural, aparece sempre mediado pelas culturas, melhor dito, mediado e expresso culturalmente. Esta mediação e expressão implicam, por um lado, que o Evangelho critica as culturas, mas, por outro, que ele apareça encoberto por elas. A tarefa da(s) teologia(s) é servir a mensagem cristã, mantendo, como se disse, em correlação crítica, aquele duplo pólo, mas em vigilância permanente por causa das possibilidades de encobrimento, também e sobretudo encobrimento ideológico. Este trabalho é sempre complexo, porque a(s) própria(s) teologia(s) está (estão) de facto sempre ameaçada(s) pelo perigo da ideologia. É assim que, no caso em estudo, a categoria de “género”, proveniente das ciências humanas e utilizada desde os anos sessenta e setenta do século XX (os gender studies são da década de setenta) no sentido de mostrar que as diferenças entre homens e mulheres (desigualdades, hierarquia, subordinação da mulher, domínio masculino...) não têm a sua base na natureza, mas na cultura são construções sociais, culturais, e daí a distinção entre “sexo biológico” e “sexo social” , é preciosa para mostrar como a mensagem do Evangelho, cuja intenção radical é a libertação plena de todos os seres humanos e do Homem todo, se pode ter apresentado e apresenta como factor opressivo. Vejamos alguns exemplos.
É sabido que a linguagem não é um mero instrumento para transmitir ideias já constituídas. Pensamos linguisticamente, a consciência é linguisticizada e somos na linguagem, que é “a casa do ser” (M. Heidegger). Entende-se assim, no nosso caso, a relação estreita entre a linguagem e a figura da mulher. Veja-se, por exemplo, o arrepio causado por expressões como: a cardeal-patriarca de Lisboa ou a bispa do Porto. E o que pensariam os cristãos, se, um dia, o padre, na celebração da Eucaristia, inaugurasse a proclamação da fé, nestes termos: “Creio em um só Deus Mãe toda poderosa”? Aqui, na base da relutância e do reboliço, embora seja claro que Deus transcende a determinação sexual, está também uma deficiência e mesmo uma ignorância da biologia não se esqueça que a descoberta do óvulo feminino data apenas de 1827. De facto, São Tomás, no quadro do hilemorfismo aristotélico, assumiu que, na procriação de um novo ser humano, a mulher dá a matéria, que é passiva, sendo o homem a dar a forma, que é activa. Assim, se a mulher, em última instância, é passiva, como é que pode ser imagem do Deus infinitamente activo e criador, como é que pode pregar nas igrejas, etc.? Tomás de Aquino dirá expressamente que a mulher é um “varão falhado”: de facto, de si, a força activa do sémen está orientada para gerar uma realidade semelhante, portanto, do sexo masculino; a geração do feminino acontece devido a uma fraqueza. Daqui concluirá que por natureza a mulher é subordinada ao homem, que os filhos devem amar mais o pai do que a mãe, que o sacerdócio está vedado à mulheres, que elas não podem pregar, pois a pregação é um exercício de sabedoria e autoridade.
A relação da mulher com a possibilidade da ordenação sacerdotal implicaria só por si um tratamento longo e aprofundado, tanto mais quanto o debate tem de excluir o equívoco de que o sacerdócio significa acesso a posições de poder. Nunca se sublinhará suficientemente que do que se trata é de serviço e não de domínio. Mas, no âmbito do acesso ao sacerdócio, o que seria necessário explicar em primeiro lugar é que a raiz fundamental das dificuldades se encontra na concepção sacrificial da Eucaristia. Na realidade, embora possa haver nele alguns resquícios dessa tentativa interpretativa, o que é facto é que o Novo Testamento evitou o uso da palavra hiereus (o sacerdote que oferece sacrifícios) aplicada aos que presidiam às comunidades cristãs. A interpretação sacrificial da Eucaristia apareceu fundamentalmente por causa da necessidade de, no quadro do Império Romano, mostrar que os cristãos, acusados de ateísmo, também ofereciam um sacrifício. Note-se, porém, que a orientação teológica de conceber a morte de Cristo enquanto sacrifício e resgate exigidos por Deus Pai para aplacar a sua ira acabou por apresentar o cristianismo numa perspectiva de religião cruel e bárbara e impôs ao Ocidente uma profunda carga de culpabilidade, o que constitui uma contradição, quando se pensa que a mensagem de Jesus tem como seu núcleo a experiência e o anúncio do Deus que é Amor. De qualquer modo, a partir do momento em que aparecem os sacerdotes em conexão com o sacrifício, surge a ligação com as categorias religiosas universais de puro e impuro. Ora, a mulher era considerada impura sobretudo por causa da menstruação. Por essa e outras razões, também se foi impondo na Igreja católica a lei do celibato para os padres, e as mulheres ficarão inevitavelmente excluídas do altar, mesmo se, no princípio do cristianismo, presidiram ao memorial eucarístico celebrado nas casas particulares. Por outro lado, quando se pretende fundamentar a exclusão das mulheres ao acesso à ordenação sacerdotal com base em que Jesus na Última Ceia só teria dado esse poder a homens, é necessário responder, como faz com uma ponta de cinismo o exegeta Herbert Haag, recentemente falecido, que então só será legítimo ordenar judeus, já que os apóstolos eram judeus.
Neste contexto, deve também referir-se o pecado original, elaborado essencialmente por Santo Agostinho, pois não se encontra na Bíblia. Baseado na tradução latina da Carta aos Romanos, 5, 12, referente a Adão: “no qual todos pecaram”, ele, contra o texto original grego, que diz: “porque todos pecaram”, interpretou que o pecado de Adão não é apenas o primeiro da série de todos os pecados cometidos pelos homens e pelas mulheres ao longo da história, mas que esse pecado é um pecado hereditário (em alemão, distingue-se entre Ursünde e Erbsünde), de tal modo que é um pecado de todos os seres humanos, transmitido por geração pelo acto sexual. Portanto, o recém-nascido não é inocente, nasce em pecado, do qual, para evitar a condenação eterna, só o baptismo o pode libertar. Foi pelo pecado de Adão que veio todo o mal ao mundo (mas os teólogos não esqueciam que uma das versões do Génesis sobre a criação e a queda dizia que foi Eva que tentou Adão), incluindo a morte. Esse pecado tornou a humanidade toda “massa condenada” ao inferno, do qual só alguns são libertos pela graça imerecida de Deus. As mulheres ficaram particularmente afectadas por esta doutrina, não só porque são as tentadoras e sedutoras, mas porque acabam por levar consigo ao longo de nove meses no seu ventre alguém concebido em pecado e que transporta o pecado merecedor do castigo eterno. Não se esqueça que Santo Agostinho não hesitou em deixar cair no inferno, embora concebido de forma mais mitigada, as crianças sem baptismo, de tal modo que é incalculável o sofrimento das mães cristãs que ao longo dos séculos viram os seus filhos morrer sem baptismo.
Uma experiência pessoal sexual dramática de Santo Agostinho e uma exegese errada deram azo a uma doutrina cruel e contrária à Boa Nova de Jesus. Tanto assim é que, neste enquadramento, surge a doutrina da concepção imaculada de Nossa Senhora. A festa que se celebra no dia 8 de Dezembro, com feriado nacional, tem aqui a sua base, precisamente com o nome de Imaculada Conceição. Quer dizer, Maria, a mãe de Jesus, seria uma excepção à universalidade do pecado original, pois teria sido concebida sem pecado. Neste âmbito, a figura de Nossa Senhora é paradigmática no campo da fé e da teologia. Por um lado, Maria de Nazaré é tratada no Novo Testamento com sobriedade, mas sem deixar de se lhe atribuir inclusivamente traços revolucionários: “Derrubou os poderosos dos seus tronos e exaltou os humildes. Aos famintos encheu de bens e aos ricos despediu de mãos vazias”. Por outro lado, no quadro de influências pagãs, de uma Igreja com uma hierarquia masculina e de uma fé vivida numa sociedade patriarcal e em que era necessário evitar toda uma linguagem que lembrasse as deusas pagãs da fertilidade, Deus é simbolizado com traços masculinos e, paradoxalmente, como contraponto, Maria acaba por ser quase divinizada. Ela é arrancada à humanidade e, à maneira de mito, esquecendo também que o Credo não é de modo nenhum um tratado de biologia, idealizada como virgem e mãe. Então, é necessário perguntar se este ideal impossível de virgem e mãe é favorável ou desfavorável à libertação da mulher ou se, pelo contrário, contribui para a sua opressão. Como se sentirão as mulheres que não foram concebidas sem pecado e têm de carregar no seu ventre com o fruto do pecado? É certo que, frente a uma imagem masculina de Deus com traços inclusivamente cruéis e a uma Igreja também profundamente masculinizada na sua hierarquia e numa sociedade onde a figura do pai tão frequentemente aparecia (aparece?) como distante e ditatorial, Nossa Senhora surge como uma espécie de almofada maternal. Mas, depois, a nível religioso, chega-se ao cúmulo de atribuir-lhe, em visões e aparições, afirmações que, teologicamente, são, no mínimo, discutíveis: “Meus filhos, a mão do Meu Divino Filho está prestes a descarregar a sua justa ira sobre o mundo; não consigo detê-la. Ajudai-me! Se invocardes a minha Chama de Amor, juntos salvaremos o mundo.”
A igualdade radical de género não deverá pôr em causa o modo próprio de as mulheres habitarem o mundo nem a riqueza das diferenças são conhecidos os debates entre o feminismo da igualdade e o feminismo da diferença. Mas o que fundamentalmente se segue desta breve reflexão é que a teologia terá cada vez mais de atender à sua dimensão crítica no sentido de pôr a nu tudo o que de ideológico se foi infiltrando na fé, na dogmática e na piedade cristãs. Para que a revelação cristã, que tem como seu critério de verdade a liberdade e a libertação plena de todos os homens e mulheres, participe cada vez mais intensamente na história da emancipação. Afinal, o homem bíblico é mesmo o homem-corpo vivo, a ponto de se poder e dever dizer que o cristianismo é, em última análise, uma religião do corpo: no princípio, Deus criou o Homem à sua imagem e semelhança homem e mulher os fez e abençoou a sexualidade e viu que era tudo muito bom; na Bíblia, encontra-se um dos livros mais eróticos da história da literatura mundial o Cântico dos cânticos; Deus mesmo em Jesus Cristo assumiu a corporeidade: “o Logos fez-se carne”; a humanidade corpórea encontra-se, pela ressurreição de Jesus, no seio da Trindade. Por outro lado, quando se está atento à atitude, ao comportamento, à prática verdadeiramente subversivos e revolucionários de Jesus na sua relação com as mulheres, toma-se consciência da urgência em fazer a história do mal-estar na Igreja em relação ao corpo, ao sexo e à mulher, e tentar compreendê-la. Uma teologia liberta tornar-se-á libertadora. E a presença maior das mulheres na prática teológica ajudará a todos na compreensão mais profunda e activa da Boa Nova de Jesus. Esta obra é um contributo indispensável nesse sentido.
|
|
Sobre o livro
Nem as duas coordenadoras da edição, Manuela Silva e Fernanda Henriques, que assinam a apresentação do livro; nem nenhuma das 6 autoras de textos (apenas uma é do país vizinho), respectivamente, Ana Maria Jorge, Isabel Gomez Acebo, Teresa Toldy, Maria Carlos Ramos, Maria Luísa Ribeiro Ferreira, Maria Joaquina Nobre Júlio; nem nenhum dos 5 autores de textos, respectivamente, João Duque, António Matos Ferreira, Joaquim Cerqueira Gonçalves, Armindo dos Santos Vaz, José Tolentino Mendonça; nem tão pouco Anselmo Borges que assina o Prefácio fazem a mais pequena referência ao Jornal Fraternizar que tanto tem contribuído no nosso país para pôr na ordem do dia a problemática "Teologia e Género", muito menos, à obra, única no género, Em Memória delas. Livro de Mulheres (Edição Campo das Letras, Porto), do seu director Pe. Mário de Oliveira. Apenas Armindo dos Santos Vaz, padre carmelita e Professor Associado da Faculdade de Teologia da UCP, que disserta sobre "Reabilitação de «Eva», ou o elogio do feminino", se refere ao livro Nem Adão e Eva, nem Pecado Original (Campo das Letras) do Pe. Mário, mas sem coragem para identificar o nome autor, de tão maldito que se terá tornado no universo católico daquela Universidade. Eis a referência: "Sendo assim, nem é preciso dizer que «Adão e Eva nunca existiram", quando se quer dar um ar 'avançado' ao entendimento desse texto bíblico". Regista-se a omissão e absolve-se do respectivo pecado a Editora Ariadne, que não tem culpa que autoras, autores tão credenciados como os que "fazem" o volume de 265 páginas que ela em boa hora deu à estampa no nosso país, assim se comportem com um dos seus irmãos de caminhada e de causas. Mas assim somos os humanos, ainda tão ao contrário do Deus Criador que está apostado em fazer-nos à sua imagem e semelhança, em feminino e em masculino. Leiam o livro e, se puderem, leiam também o silenciado Em Memória delas. Livro de Mulheres.
|
|
OUTRAS MENSAGENS
Rabanada de Vento
E-mail. Ana: Olá Sr. Padre Mário de Macieira da Lixa. Chamo-me Ana e tenho 18 anos. Vivo num colégio de Irmãs Católicas há 13 anos, mas saí com as ideias do avesso (do ponto de vista delas). Estamos no mês de Maio e, como pode imaginar, por estes lados é animado.
Hoje, apesar de eu ter um teste de matemática, tive que ver com o resto das miúdas um filme sobre o "Milagre de Fátima", aquele em que entra o Diogo Infante e a Catarina Furtado. Acho que nunca acreditei nisso na minha vida. Desde pequenina que vejo Fátima apenas como uma mera história. E lembrei-me de si, enquanto via o filme. Aliás, lembrei-me do título do seu livro: Fátima Nunca Mais.
Dei então uma fugida à internet para descobrir mais qualquer coisa sobre o conteúdo do livro e qual não é a minha surpresa quando vejo que o autor é um padre!
Enfim, deixo aqui os meus mais sinceros cumprimentos e a promessa de que lerei o livro.
p.s. Reparei que menciona sempre o feminino antes do masculino, e chego à conclusão que o objectivo é para se diferenciar dos outros padres e da Igreja em geral que secundarizam a mulher. Estarei certa?
N.D.
Olá, Ana!
Bem-haja pela sua mensagem cheia de juventude. E de lucidez. Fiquei muito feliz. As freiras a quererem impingir-lhe e às suas companheiras do colégio a mentira de Fátima, através de um filme bobo que é um atentado à inteligência das pessoas e um insulto ao Deus de Jesus, e a Ana, enquanto vê o filme, a lembrar-se de mim e do meu livro FÁTIMA NUNCA MAIS e a tomar a decisão de, logo após, ir procurar na Internet mais informação a propósito. Que coisa mais bonita e feliz!... E agora ainda aqui está a escrever-me com toda esta naturalidade e simplicidade. Só posso ver o dedo de Deus em tudo isto. Fomos feitos para a Verdade e para a Beleza, como para o Amor e para a Liberdade, e não descansamos enquanto não descobrimos o caminho (“Eu sou o caminho”, diz Jesus) que, ao ser percorrido, nos levará até lá.
Faz muito bem em ler o meu livro. E depois desse, poderá ler outros mais, vida fora. Um beijo.
E-mail. Teresa: Caro Companheiro. O livro que lhe adquiri, Na companhia de Jesus e de Ateus, tem andado a circular junto de colegas e tem recebido espantosos comentários, de modo muito positivo. Pena que as finanças (e a mentalidade...) das gentes ande pelas ruas da amargura, e não se lhes dá para investir em livros.
Fique certo, no entanto, que o sr. Pe. anda a abrir os olhos a muita gente. Sei que não lhe falta coragem, por isso, uma vez mais, obrigada, parabéns e até breve.
Fraternalmente,
E-Mail. Marcelo: Querido padre Mário. A sua mensagem de 19 de abril sobre a Páscoa de Jesus deixou-me profundamente tocado e foi, para mim, a Boa Nova, o próprio Evangelho. A morte física em si não é problema. Como bem se depreende de tuas palavras, é ela que nos abre para a dimensão do outro, da alteridade. O problema está justamente na forma como vivemos, no aqui e agora de nossa História!
É de coração que eu falo: como é gostoso e libertador viver essa fé jesuanicamente ateia ou ateisticamente jesuânica. O seu texto foi para mim verdadeiro sacramento de crisma: ungiu-me com a coragem de testemunhar que o Deus vivo só é vivo de facto em nós. Não precisa de milagres nem de manifestações sobrenaturais. O Deus vivo o que quer é apenas e tão somente o prazer de sermos humanos, profundamente humanos. Numa sociedade justa, fraterna, anárquica. Acredite, estou profundamente emocionado com a sua mensagem e, se me permitir, ela será proclamada como Evangelho na nossa celebração do próximo domingo em nossa CEB.
E, mais ainda: esta mensagem coincide com um forte momento de minha vida pessoal em que renunciei a um cargo administrativo em nosso sistema educacional brasileiro, cargo que quase todos almejariam, justamente porque eu não queria oprimir ninguém. E esse cargo traria recompensas e poder, mas em troca venderia minha alma, adoptando politicas neo-liberais no sistema educativo. Não deixei sequer o convite ser exposto: a simples exposição completa me ofenderia e ofenderia a minha fé jesuânica. Sou cristão jesuânico e como tal anarquista e socialista... Voltei como professor para a sala de aula na periferia de São Paulo. Lá sim quero organizar alunos e comunidades para defenderem seus direitos.
Assim, querido Padre Mário, estou em Páscoa: tive força de vida para romper as estruturas de morte e poder respirar. E tive também a vontade de, como você mesmo diz, partilhar maieuticamente essa experiência com você. Viver numa perspectiva libertadora faz-nos menos infantis e mais felizes. Estou muito, muito feliz mesmo, em ser livre. Como Jesus pediu que fôssemos.
E, por fim, aqui no Brasil, conte sempre comigo: sabe, em nossa comunidade, somos vários os leitores de teu site na internet e pensamos até em organizar, para Maio, uma pequena colecta que mandaríamos, aqui do Brasil, para a construção do vosso Barracão de Cultura. As pessoas de nossas Cebs animaram-se com a ideia. E alguém levantou: mas com tantos problemas sociais aqui, porque iríamos ajudar alguém do outro lado do mundo? Ao que prontamente respondi: porque a solidariedade não tem fronteiras e ao Sopro do Espírito vai onde quer. Por isso, e se tudo der certo, organizaremos uma pequena colecta entre Maio e Junho. E se isso for efectivamente realizado, posteriormente entrarei em contacto para mandar a pequena oferta de nossas comunidades de trabalhadores sofridos, mas que em todos os ofertórios de nossas celebrações cantam: “Quem disse que não somos nada / que não temos nada para oferecer? / repare nossas mãos abertas/ trazendo as ofertas de nosso viver!
Assim, é com minhas mãos e sobretudo com meu coração aberto que lhe ofereço, por ora, meu carinho, minha estima e minha solidariedade. E, por fim, orgulho-me de ser cristão, primeiro por Jesus Cristo, o Homem Pleno, e depois, por pessoas como você, padre Mário.
A paz do Cristo Libertariamente Anárquico.
N.D.
Companheiro Marcelo.
As suas palavras voltaram a deixar-me em emocionada EUCARISTIA. Bem-haja.
É claro que nem precisa da minha autorização para utilizar o quase-poema a que se refere na celebração.
É da maneira que estarei intensamente com todas, todos vocês.
Deixemos que o Espírito nos faça outros Jesus, hoje e aqui.
O meu abraço fraterno, extensivo a toda a Comunidade. Convosco Mário.
Cós. Samuel Neto: Em primeiro lugar, quero expressar a minha grande satisfação por poder receber o FRATERNIZAR. Se tivesse que comparar este acontecimento, diria que se assemelha a uma rabanada de vento que, por instantes, cria o caos e que, ao mesmo tempo, refresca, areja e arruma. Enquanto ele existir, quero continuar a receber as suas provocações, por forma a me ajudar na caminhada desta vida.
Quero participar que nem sempre recebo o Jornal, e que já por diversas vezes tive de telefonar, para posteriormente me ser enviado. Gostaria de saber se este facto está ligado exclusivamente a falhas dos correios, ou se há alguma responsabilidade do próprio Jornal. Queria ainda pedir que me seja enviado sempre um recibo do valor enviado, só para controlo próprio das minhas comparticipações. Quero ainda aproveitar para fazer uma sugestão à Direcção do Jornal: Dado que o Jornal é enviado a muitas pessoas que depois não enviam contribuições e que isso pode pôr em causa o seu futuro, proporia o seguinte: a. Todos os assinantes pagariam anualmente o equivalente a duas assinaturas do Jornal; b. Esta premissa garantiria a publicação do dobro dos jornais, sem perdas para o Jornal; c. Com critérios bem definidos, e sempre tendo em atenção as dificuldades económicas dos leitores, a Direcção definiria quem receberia sem custos estes excedentes; d. Sempre que algum assinante propusesse um novo assinante, pagaria com a proposta uma assinatura anual em nome do novo assinante.
Com estes ou outros critérios bem definidos, criaríamos uma coisa que acho muito importante - o Jornal teria sempre condições para subsistir, e não seria por causa de outros, para os quais o Jornal não tem o valor que os assinantes lhe reconhecem, que ficaríamos irremediavelmente sem condições para o continuar a publicar. Considero isso uma injustiça para com todos os leitores e assinantes, para quem o FRATERNIZAR é uma preciosa bênção nas suas vidas. Um abraço para todos e bom ânimo para o Pe. Mário.
N.D.
Aqui fica a sua sugestão. Cada qual fará o que entender em consciência. Mas bem sabe que não é só de dinheiro que o FRATERNIZAR carece. Também carece de pessoas, concretamente, de um novo director, perito em teologia de libertação e desprendido do dinheiro e dos privilégios. Até hoje, o dinheiro tem chegado. E há-de continuar a chegar. Precisamos de pessoas à altura do percurso já andado. E que o prossigam ao seu jeito, mas com a mesma fidelidade ao Espírito. Quanto às falhas na recepção dos exemplares do Jornal, serão exclusivas dos correios. Da nossa parte, sempre temos enviado cada edição para os endereços que temos no computador, sem qualquer discriminação. Tal como o sol quando nasce é para todos, também o Fraternizar é para todos os assinantes, independentemente, de terem ou não a assinatura em dia.
Castelo de Paiva. José Seabra:
Junto envio... euros. Da última edição, agradou-me especialmente o Editorial D. Dinheiro que bate em cheio na ganância e hipocrisia humanas e na estupidez do ser humano que tudo destrói: as florestas, os campos aráveis, polui mares, ares e rios, na mira do lucro fácil, com a bênção dos políticos, bispos e do Banco do Vaticano, representado em Portugal pelo "santuário de Fátima".
Enfim, prefiro a filosofia budista e a sabedoria do Dalai-Lama à hipocrisia de papas autopromovidos a santos e autênticas "fábricas de santos", como foi João Paulo II. (...)
Parabéns, pe. Mário pelos Destaques 1 e 2. Jesus Cristo não tem culpa da Igreja que tem. Resta-nos a Natureza, onde está a verdadeira Fé.
Benavente. Silvestre: Não posso nem devo deixar de aproveitar a oportunidade para lhe transmitir a minha opinião acerca do Jornal e ela resume-se à expressão: É muito mais do que alguma vez imaginei! Confesso-lhe que a decisão de efectuar a assinatura foi um acto de pura solidariedade, estilo "o Jornal de que é director um homem como este deve aumentar o número de assinantes"; mas ao receber os exemplares que me enviou, logo percebi que afinal tenho andado a perder informação preciosa. Felicito-o pois pelo que faz e felicito-me pelo que a partir de então passei a usufruir. Um abraço.
|
|
|
|